quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Animais


                                                                                                   D.M.Bontorin

      A Platéia observa ansiosa. O Animal se dirige ao meio do picadeiro. Todos que o observam também são animais, doces seres que esperam pacientemente na fila do abatedouro.
     As luzes se acendem. O Animal está com medo, nunca apresentou seu número para tamanha Platéia. Um fio de suor percorre suas costas. Ele respira fundo, tentando encher os pulmões com mais do que apenas ar, com coragem. Sua voz preenche o vazio e rapidamente é perseguida por risos abafados, que crescem gradativamente até transforma-se em uma gargalhada estridente. Ele timidamente olha para a Platéia, ela ri de seu modo de falar. O Animal permanece estático. Seu rosto queima como brasa tornando-se de um vermelho vivo, que a apenas a vergonha pode trazer a tona. Revolta-se, não quer mais permanecer no picadeiro. Olha para as arquibancadas com a esperança de um naufrago, a olhar para o horizonte. Lágrimas, resultantes do delírio causado por uma boa piada, escorrem dos olhos da Platéia, considera o modo como ele se movimenta hilariante.
     Após o que lhe pareceu uma eternidade, o mestre do picadeiro exige aplausos da Platéia e pede que o Animal se retire dando lugar ao próximo. Ele senta na arquibancada. Seu coração pulsa desesperado em seu peito. Seu corpo age como se estivesse exposto ao frio mais cruel, sem proteção alguma. E mesmo em tamanha situação de desconforto, ele começa a ser absorvido pela Platéia, esquecido.
      A apresentação do Outro começa. O Animal gargalha. Ele ri das roupas do Outro, de seu modo de falar, de andar, de mover os braços. Em meio à loucura provocada pelo riso os pensamentos passam desconexos por sua consciência, desaparecendo tão rápido quanto surgiram.
     O Outro abre espaço no picadeiro para que o Terceiro se apresente. No tempo decorrido entre a saída deste e a entrada daquele, um pensamento começa a martelar incessantemente na cabeça do Animal até conseguir chamar sua atenção.
     “Nós somos iguais”
     Ele olha para a Platéia na arquibancada, da cabeça mais longe até aquelas que estão dispostas ao seu lado. Ele vê sua imagem refletida em cada uma delas. O mesmo constrangimento, o mesmo medo de humilhação, a mesma necessidade de humilhar. O riso que antes existia em seus lábios foge rapidamente, deixando para traz uma expressão de horror. Ele empurra a Platéia e corre para longe do picadeiro, nunca mais voltará aquele lugar. Pois, humilhar o diferente é divertido, mas humilhar o igual é insano.